Desafios do transporte urbano de passageiros

Transporte_público

por Gustavo Queiroz

Geralmente, os serviços de ônibus no transporte urbano são controlados pelos governos locais, que determinam rotas, tarifas e a infraestrutura, que podem incluir desde os pontos de ônibus mais simples até as mais complexas obras de engenharia para a formação de sistemas BRT, por exemplo.

A operação, entretanto, costuma ser outorgada às empresas privadas de transporte que irão operar o sistema sob contrato de concessão. Além de investir na compra dos ônibus, essas companhias ainda respondem pela contratação de motoristas, cobradores (quando há), mecânicos, gestores e outros profissionais e serviços necessários para manter a operação regularmente.

Os termos do contrato variam de acordo com as exigências de cada município. Tratam-se de concessões multimilionárias que afetam, diretamente, a vida dos passageiros todos os dias. Ou seja, apesar de todo o potencial positivo que essas licitações podem gerar para a sociedade com tarifa justa e transporte de qualidade (veículos modernos e sistemas eficientes), sendo um negócio lucrativo para os operadores.

Infelizmente, nos acostumamos a ver concessões que não cumprem suas promessas, gerando a percepção de que o poder público não consegue gerir o serviço da melhor forma para garantir o desenvolvimento efetivo do sistema de transporte urbano.

Em artigo publicado em 2018, especialistas em transportes do Banco Mundial elencaram quatro requisitos básicos para uma boa licitação. E por que eu estou falando disso agora? Porque estamos em 2020, ano de eleições municipais. Um período em que promessas começam a acontecer a rodo pelas prefeituras e candidatos. Mas, um período, também, em que prefeituras antecipam licitações deste serviço.

Vamos aos quatro requisitos para assegurar a lisura e a eficiência dos serviços licitados.

  1. Baixa barreira de entrada para promover a concorrência. Se refere a uma tendência de negociação entre as cidades com os operadores existentes, dificultando uma concorrência real; há, ainda, aquelas prefeituras que criam requisitos que favorecem as empresas de sempre e impossibilitando que os recém-chegados ganhem uma oferta. O Banco Mundial argumenta que, mesmo que as razões sejam legítimas pelas quais os governos podem querer proteger os operadores tradicionais, “somente uma concorrência verdadeira com condições equitativas pode incentivar as operadoras a aumentar a eficiência, reduzir custos e melhorar os padrões de serviço”.
  2. Definir a duração ideal do contrato. Os operadores, normalmente, desejam conquistar contratos estáveis e com o maior tempo possível. Afinal, as empresas respondem por altos investimentos em capital financeiro e humano para iniciar as suas operações e precisam de algum tempo para recuperar tais valores e lucrarem com suas operações. Contratos curtos também podem inviabilizar o financiamento para a aquisição de frota. Para as prefeituras, longos contratos podem ser de riscos, afinal, mudanças nos padrões de mobilidade podem ser necessárias. Segundo o Banco Mundial, “cidades como Londres descobriram que os contratos de cinco a oito anos são suficientemente longos para dar aos operadores um retorno justo sobre seu capital e esforço, preservando os interesses da cidade”.
  3. Usar incentivos de forma inteligente. Via de regra, as concessões contemplam um sistema de penalidades e recompensas financeiras para assegurar que os operadores se adequem aos padrões de desempenho definidos no contrato, desde que façam sentido ao negócio do operador. O Banco Mundial alerta que “penalidades extremas ou impraticáveis, como a rescisão do contrato, não são críveis nem exigíveis, a menos que existam outros operadores no mercado habilitados a assumir o controle”. Por outro lado, multas muito baixas não impedirão que os operadores reduzam os serviços para diminuir seus custos operacionais.
  4. Adaptar os contratos ao tipo de serviço. “Sob um contrato de custo, as operadoras são pagas com base em variáveis operacionais específicas, como o número de quilômetros registrados”, destaca a recomendação do Banco Mundial. As empresas devem se concentrar, exclusivamente, no fornecimento de serviços, enquanto a maior parte do risco é transferido para a cidade (demanda flutuante, evasão tarifária, etc.). Isso funciona em condições favoráveis ao acompanhamento da aplicação, como nas rotas de alta densidade (como os corredores de BRT). Entre as soluções para que os operadores cumpram os seus objetivos de desempenho e atendam a tantos passageiros quanto possível, se destacam os contratos de custo líquido, em que o pagamento depende em grande parte do número de passageiros transportados. Soluções híbridas que combinam variáveis operacionais e riscos de demanda também podem ser interessantes.
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