A caça ao tesouro. Quem fica com o espólio da Ford Caminhões?

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Abandono do mercado pela Ford gera ações da concorrência direta em busca do espólio de mercado

por Roberto Queiroz

Passando uma imagem de empresa organizada e revelando boa parte de seus planos para ocupar o espaço deixado pela finada Ford Caminhões, a Mercedes-Benz mostrou um planejamento bem estruturado de ações que visam capturar o cliente da montadora fujona. Mas a marca da estrela não é a única, seguida de perto pela Volkswagen Caminhões e, seguindo-se uma ordem provável, por Iveco, Volvo e Scania. Agrale, com a operação de caminhões totalmente comprometida, não é considerada ameaça.

Ari de Carvalho
Ari de Carvalho, diretor de Vendas Caminhões da Mercedes-Benz.

Ari de Carvalho, diretor de Vendas Caminhões da MB, conta que a estratégia da companhia está baseada em “três coisas: uma análise de portfólio, identificando na linha as especificações que mais se aproximam do produto Ford, uma análise de preços, para aproximar os Mercedes dos valores praticados pela concorrente e uma análise da rede, identificando pontos de complementariedade. ”

A grosso modo, a Mercedes vai atacar o mercado Ford com versões simplificadas do Accelo, como um 815 de entrada para brigar com a memória do F-4000, e do Atego 2426 básico contra o semipesado Cargo. Ari comenta que “só não temos um produto 4×4 nem vamos fazer, mas podemos ajudar algum implementador externo que se interesse. O Unimog não será lançado no Brasil. ”

Cerca de 30% das vendas Ford no mercado de leves vem de licitações e briga de preços, segundo análise interna da MB. Ari de Carvalho acrescenta que a Mercedes “está olhando muito forte para os clientes Ford, mapeando seu perfil e oferecendo taxas atrativas. A SelecTrucks também tem um programa especial para receber caminhões Ford e a área de consórcio está formando um grupo novo justamente agora para atrair esses clientes. ”

Por sinal, a SelecTrucks está ampliando bastante suas operações, contando já com 12 pontos, incluindo também Campinas, Limeira, São José dos Pinhais, Santos, Recife, Fortaleza, Novo Hamburgo, Cuiabá e Içara.

Volkswagen

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Sergio Guimarães Pugliese, gerente Executivo de Operações de Campo da VWCO.

A montadora, quando recebe alguma pergunta desconfortável de jornalistas, anda alegando que, agora como parte do Grupo Traton, precisa adotar uma política low profile. O mercado quer informação, como por exemplo qual o motivo para a marca praticar alguns preços tão abaixo da concorrência. Tem caminhão VW custando até R$ 90.000,00 abaixo do concorrente mais próximo.

Posicionamento de preços é uma realidade, mas tanto assim parece estratégia para ocupar o lugar da Ford até nessa categoria de menor preço do mercado. A ver. Isso mostra a adoção da menor margem possível antes do prejuízo, apertando tanto fábrica quanto rede de distribuidores.

Mas a VWCO é marca forte a perseguir esse espólio Ford, pois tem produto para isso. Nos leves, destaque para sua linha Delivery e, nos semipesados, para um bom leque de Constellation. Sergio Guimarães Pugliese, gerente Executivo de Operações de Campo, comenta que “o mercado se auto regula, mas não há uma orientação clara para atacar clientes Ford.”

Os produtos Ford Cargo e VW Constellation tem muita coisa similar, o que facilita ações da rede no pós-vendas, mas seria preciso uma ação organizada nessa direção para que surte melhores efeitos. “Como a rede Volkswagen já é forte, não assedia a rede Ford e prefere um caminho de consolidação de grupos a buscar empresas pequenas”, comenta Pugliese, no que não deixa de ser uma estratégia de posicionamento para a rede.

Mas, por mais importante que sejam 12% de mercado, Ford não é tudo e a Volkswagen já tinha algumas prioridades. A rigor, o foco da companhia para este ano está no Delivery e, em um segundo nível, uma retomada de TGX, que terá aumento de oferta, com redução nos prazos de entrega. Como sinal de acerto, o Express já agrega 2% no segmento competitivo entre 2,8 e 3,5 toneladas, faixa de entrada. A montadora pretende para este ano repetir o bom desempenho do segundo semestre de 2018.

Recentemente, a montadora homologou os modelos 17.260 e 24.260 para uso genérico. O produto, focado inicialmente para licitações, além de varejinho, é uma versão pé de boi, até para quem não precisa dos 280 cv já disponíveis. Por preço, é opção para cliente que olha mais o bolso na hora da compra. “Vamos ocupar algum espaço Ford, mas ainda não deu para mensurar”, acrescenta Pugliese.

Iveco

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Ricardo Barion, diretor de Marketing e Vendas da Iveco para a América Latina.

Enquanto aguarda o final de junho, onde haverá o lançamento dos mini Tector, com os modelos leve e médio de entrada apresentados na Fenatran 2017, a Iveco observa, por meio de seu diretor de Marketing e Vendas Ricardo Barion, que “esperava o Governo novo com um otimismo, mas isso não se confirmou. No primeiro quadrimestre o mercado ainda reaqueceu um pouco, ficando 50% acima do ano passado, mas já estramos em um compasso de espera, com alguns receios. ”

A montadora trabalha com a previsão oficial de aumento de 20% nas vendas, por causa do primeiro trimestre. “Se a Previdência for aprovada logo, a projeção fica maior, mas as incertezas do governo preocupam”, diz. No caso específico, a Iveco tem as vendas puxadas hoje pelas linhas Daily, essa em cima do buraco Ford, e Hi-Road, com 400 unidades desde fevereiro e clientes repetindo compra.

A linha Tector terá o papel de ser opção para os clientes Ford, tanto com os modelos de 8 e 11 toneladas quanto com os semipesados. Nesse último caso, a mesma transmissão Eaton Autoshift reforça a similaridade entre os dois portfólios. Aliás, a Iveco tem levado clientes Ford a sua fábrica em Sete Lagoas, MG, para ações de conhecimento do produto. “Já são mais de 150 clientes contatados e levados. Nossa proposta é abrir um relacionamento novo, com uma visão diferente e mudar a percepção que tinham do produto Iveco. Se o Cargo era um produto ajustado, o Tector é similar e vira opção”, propõe.

Barion reforça a ideia de que a Iveco quer oferecer manutenção sem precisar ser o serviço mais barato de todos de qualquer jeito. “A rede Iveco está em reconstrução. Trocamos 60% dos grupos em três anos. Em alguns casos, o pessoal da Ford veio a nós. Em outros, fomos atrás. Teremos novidades nisso em uns dois meses”, oferece. Em função dessas tratativas, o Marketing da marca cancelou todas as ações de mídia no primeiro semestre, focando os recursos em seu canto de sereia.

O ambiente que Barion trabalha para sua rede, inclusive os novos entrantes, considera necessidades, focadas em pesquisas, de continuar crescendo em qualidade e em atender as expectativas do cliente. Os contratos de manutenção, mais concentrados nos pesados, já são de 1 em cada 3 veículos vendidos. Fora a expectativa da oferta dos novos 9 e 11 toneladas, principalmente para os mercados do Nordeste.

Na Volvo, o diretor de Vendas Caminhões, Alcides Cavalcanti, comentou recentemente uma avaliação de portfólio feita na companhia para valorizar a linha VM, na busca por clientes do antigo Cargo Power. E acredita em bons resultados na oferta de caminhões com tração 6×2, principalmente, e também 6×4, para clientes Ford. Aparentemente, a rede não desperta interesse por não perfil para clientes de extrapesados.

Uma questão importante, envolvendo todas as marcas, é adequar as expectativas de avanço sobre o espólio Ford que, claramente, superam os 100% disponíveis…

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